sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

O Domador

"- Parabéns! É preciso ter coragem!" - disse-lhe o amigo.
Naquele momento ele sentiu que toda a sua roupa se tingia de vermelho e dourado, sentiu crescerem-lhe galões dourados sobre os ombros, um chapéu alto e brilhante na cabeça, botas de cano, bigode farto, olhar intrépito, chicote na mão, coragem na outra, ali, todo, inteiro: o domador de feras.
Mas depois pensou...
Talvez as botas não dessem muito jeito, porque eles eram muito mais rápidos a brincar do que os felinos mais ágeis... e aquelas botas eram um bocado rígidas...
E mesmo o chapéu... até os domadores de feras têm que tirar o chapéu para pôr a cabeça na boca dos leões... Ele também teria que abandonar o chapéu para encostar a cabeça às suas feras.
E o chicote,que fazia os tigres saltarem aros de fogo, também não precisava dele para que os seus saltassem por todo o lado.
Mesmo o bigode, farto como uma juba, que metia os leões a uma distância recomendável, talvez não fosse necessário, não fosse dar-se o caso de deixar os seus a uma distância maior do que a desejável.
Até os galões dourados que encorpavam a figura do domador seriam incómodos, quando os seus lhe saltassem para os ombros e se instalassem às cavalitas...

"- Sabes," - disse ele ao amigo - "eu não preciso de tanta coragem... só vou ter mais um filho."
E sorriu, como os domadores não podem, do alto das suas caras ferozes.