tag:blogger.com,1999:blog-25796831076094132662024-03-13T03:19:29.071-07:00Diário EscrípticoA ideia partiu do meu irmão: quer um texto por dia. Não importa o tamanho o tema é livre e à falta de tema que conte o dia da personagem que entender.
Muito bem. Vamos a isso. É já a seguir.NCDhttp://www.blogger.com/profile/01135063808128731194noreply@blogger.comBlogger7125tag:blogger.com,1999:blog-2579683107609413266.post-7999808766500389642008-05-05T07:07:00.000-07:002008-05-05T07:08:51.805-07:00Memória fotográfica.Um pai ausente, era o que era. Por mais que ele revisse as fotos eram raras, muito raras, aquelas em que ele aparecia. Onde estivera todo aquele tempo? O que fazia ele, para não estar ali?<br /><br /> - Eu? Tirava fotos, filho. – respondeu.NCDhttp://www.blogger.com/profile/01135063808128731194noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2579683107609413266.post-70754027555665509082008-04-07T07:13:00.000-07:002008-05-02T03:48:15.220-07:00A dança da cadeiraEu? Faço cadeiras.<br />Cadeiras como esta.<br />Boa, sólida, confortável.<br />Sou eu que a faço.<br />Só eu que a faço?<br />Não! Somos muitos! Uma equipa!<br />Na verdade eu aperto um parafuso.<br />Um parafuso da cadeira.<br />Sei cortar madeira?<br />Não é preciso, já vem cortada...<br />Estofar a cadeira?<br />Não é preciso já vem estofada!<br />Montar a cadeira?<br />Não. Sei qual é o meu lugar!<br />Aparafusar, isso sim.<br />Aparafuso como ninguém.<br />Aí sou único!<br />Bom, único não, único não sou.<br />Eu ponho um parafuso,<br />a cadeira leva doze...<br />sou um numa dúzia.<br />Aperto parafusos,<br />todo o dia parafusos,<br />parafusos, parafusos,<br />o mesmo parafuso,<br />o raio do parafuso<br />todo o dia o parafuso<br />todo o mês o parafuso,<br />todo o ano, todos os anos<br />o mesmo parafuso apertado<br />os dias em parafuso,<br />sentado numa cadeira<br />que não sei como se faz.<br /><br />Fala-se que para o ano<br />vem aí uma máquina<br />que aperta parafusos<br />tão bem ou melhor<br />em metade do tempo<br />todos ao mesmo tempo.<br />Se assim fôr, que vou fazer?<br />Eu que não sei fazer nada,<br />nem cadeiras sei fazer<br />e faço-as há tantos anos...<br />Parafusos à máquina, sinceramente...<br />Aparafusar é uma arte!<br />A alma da cadeira, os parafusos!<br />Se estão lassos tudo estala, tudo dança,<br />não há segurança,<br />e um homem precisa saber onde se senta<br />sentir solidez debaixo do corpo.<br />Experimente, sente-se!<br />Sou eu que as faço!<br />Boa, sólida, confortável,<br />sou eu que a faço:<br />a cadeira da minha vida.NCDhttp://www.blogger.com/profile/01135063808128731194noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-2579683107609413266.post-77513328043157351302008-02-15T07:53:00.000-08:002008-02-15T08:49:00.540-08:00O Domador"- Parabéns! É preciso ter coragem!" - disse-lhe o amigo.<br />Naquele momento ele sentiu que toda a sua roupa se tingia de vermelho e dourado, sentiu crescerem-lhe galões dourados sobre os ombros, um chapéu alto e brilhante na cabeça, botas de cano, bigode farto, olhar intrépito, chicote na mão, coragem na outra, ali, todo, inteiro: o domador de feras.<br />Mas depois pensou...<br />Talvez as botas não dessem muito jeito, porque eles eram muito mais rápidos a brincar do que os felinos mais ágeis... e aquelas botas eram um bocado rígidas...<br />E mesmo o chapéu... até os domadores de feras têm que tirar o chapéu para pôr a cabeça na boca dos leões... Ele também teria que abandonar o chapéu para encostar a cabeça às suas feras.<br />E o chicote,que fazia os tigres saltarem aros de fogo, também não precisava dele para que os seus saltassem por todo o lado.<br />Mesmo o bigode, farto como uma juba, que metia os leões a uma distância recomendável, talvez não fosse necessário, não fosse dar-se o caso de deixar os seus a uma distância maior do que a desejável.<br />Até os galões dourados que encorpavam a figura do domador seriam incómodos, quando os seus lhe saltassem para os ombros e se instalassem às cavalitas...<br /><br />"- Sabes," - disse ele ao amigo - "eu não preciso de tanta coragem... só vou ter mais um filho."<br />E sorriu, como os domadores não podem, do alto das suas caras ferozes.NCDhttp://www.blogger.com/profile/01135063808128731194noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2579683107609413266.post-43919417268717045332007-12-06T07:09:00.000-08:002007-12-06T08:42:55.303-08:00Encontro DopplerPrimeiro a ânsia, a curiosidade,<br /><br />a espera.<br /><br />A espera dos dias.<br /><br />As horas de espera.<br /><br />A sala de espera.<br /><br />Como se pode ter saudades de quem não se conheceu?<br /><br /><br /><br />Tic-tac-tic-tac-tic-tac<br /><br /><br /><br />No silêncio enternetecido o eco de um som,<br /><br />rápido e repetido.<br /><br />Coração de pássaro,<br /><br />pulsar da Terra.<br /><br /><br /><br />Tic-tieu-tic-tieu-tic-teu<br /><br /><br /><br />Todo o tempo liquefeito,<br /><br />os segundos transmudados<br /><br />por aquele diapasão:<br /><br /><br /><br />Tieu-tieu-tieu-tieu-tieu-tieu<br /><br /><br /><br />E naquele ritmo fugaz , escondido espreita<br /><br />o próprio sentido da eternidade.<br /><br /><br /><br /><br /><br />P.S. - Este poema é obviamente uma derivação do anterior "À espera". Foi escrito a pensar numa amiga, que está de esperanças, a propósito da sua primeira ecografia. A base de que parti foi a minha própria experiência de estar grávido, e em particular <a href="http://osnossos.blogspot.com/2007/02/sem-mais-comentrios.html">o som que aqui se pode ouvir</a>. Este som ficou para sempre marcado em mim, de tal forma que basta invocá-lo à memória para imediatamente o ouvir. O primeiro som de um filho. Obviamente, como se pode ouvir no vídeo, a primeira frase deste texto foi composta naquele dia: coração de passarinho.<br />Normalmente gosto de de simplificar os meus textos: o normal será que perca progressivamente expressões, que apure conceitos, que lime arestas que depure.<br />Mas neste caso não estava inteiramente satisfeito. Curiosamente, quanto mais alterava o texto mais tinha pena de perder o anterior. Por isso ficam os dois.NCDhttp://www.blogger.com/profile/01135063808128731194noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2579683107609413266.post-32014917596031613372007-12-04T08:16:00.002-08:002007-12-04T08:52:45.114-08:00Á espera.No silêncio enternetecido o eco de um som,<br />rápido e repetido.<br />Coração de pássaro.<br /><br />Quem disse que a eternidade<br />se media em tic-tac?NCDhttp://www.blogger.com/profile/01135063808128731194noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2579683107609413266.post-55552469975975855872007-11-30T08:16:00.000-08:002007-12-04T08:19:06.478-08:00Autêntica magia.O mago foi à janela consultar os astros: de um lado o sol aproximava-se da linha do horizonte, as nuvens coloriam-se de luz, o céu escurecia, dando relevo à primeira lua, enorme, cheia e amarela. Vénus, altaneiro, anunciava as estrelas, ainda veladas. Bandos de pássaros inundavam o ar em revoadas de chilreios.Sinais auspiciosos: estava um fim de tarde mágico.O mago desligou a luz do escritório e foi para casa.Chegou antes da sua mulher e das crianças. Foi para a cozinha e com uma varinha em forma de colher, alguns alimentos, um pequeno caldeirão ao lume e um pouco de magia, preparou o jantar.Daí a pouco chegava a feiticeira , com as crianças. Com alguns gestos de todos, como por magia, a mesa estava posta, os pratos servidos, todos à mesa comendo e conversando.A poção que ele preparara estava deliciosa e todos conheciam os seus poderes medicinais. Também o prato principal exibia os apurados filtros em que fora preparado.Para ajudar as crianças a comer, a maga tirou de uma velha cartola vários coelhos, com os quais contou uma história.Depois, claro, maçãs vermelhas, naturalmente propensas a feitiços de adormecer, e as crianças subitamente cheias de sono: fora um dia tão cheio! Enquanto a feiticeira lança feitiços de limpeza e arrumação na sala de jantar e na cozinha, o mago levita as crianças para o quarto. Com um gesto, fiat lux! Com outro as crianças deitam-se. Então ele aponta o foco de luz para a parede e começa alguns passes da sua melhor magia: algumas fórmulas mágicas, alguns gestos estudados e sobre a parede as sombras das suas mãos ganham vida, sob a forma dos mais diversos bichos. Ele conta a sua história e consegue, às vezes, o encantamento do riso, por vezes, o feitiço da imaginação.Quando termina as crianças continuam ainda com as próprias mãos, imaginando novos passes, novas criaturas, novos enredos.O mago deixa a luz ainda um pouco, para que possam contunar o seu exercício de aprendizes de feitiçaria. Afinal a magia não se aprende num dia e eles têm tanta capacidade...O casal de feiticeiros sabe que outras magias disputam a sua, que outros lançam feitiços mais longe, maiores, mais vistosos. Mas nem toda a magia é igual e eles têm muita esperança nestas crianças. Elas mostram ter poderes extraordinários! Um dos seus melhores feitiços atinge-os aos dois em cheio no coração quando vão tapar os pequenos aprendizes adormecidos e um deles suspira no sono: o seu coração cresce, cresce tanto que inunda todo o mundo de uma luz especial, de uma felicidade imensa.Como é possível - perguntam-se - que um suspiro adormecido contenha tanta magia?NCDhttp://www.blogger.com/profile/01135063808128731194noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-2579683107609413266.post-11988546244555425952007-11-29T08:14:00.000-08:002007-12-04T08:18:11.975-08:00O dia das tartarugas do meu filho.Ca-ma-rão. Tudo o mais é digestão.NCDhttp://www.blogger.com/profile/01135063808128731194noreply@blogger.com0